Posted: 19 May 2013 05:20 AM PDT
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Alan Sampaio / iG Brasília
Usuário de crack no Setor Comercial Sul, em Brasília
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Pelas estatísticas do serviço VivaVoz, ligado ao programa Crack, É
Possível Vencer, tem-se uma amostra do avanço do uso da droga no País.
Quando o atendimento foi lançado, em 2005, 7% dos aconselhamentos eram
relacionados ao crack e à cocaína. No ano passado, o porcentual subiu
para 28%. Há uma média diária de 33 ligações em busca de auxílio.
"É um número significativo", afirma a coordenadora do serviço, a
professora da Universidade Federal de Ciências da Saúde, Helena Barros.
Transformado em utilidade pública no ano passado, quando foi integrado
ao programa criado pelo governo federal, o VivaVoz (132) passou a
atender todos os dias da semana, sem interrupção, como um "CVV das
drogas".
Os resultados alcançados pelo trabalho indicam o quanto o atendimento
por telefone pode ser promissor. "Principalmente entre jovens", diz
Helena. Estudo feito com 1.124 usuários de crack ou cocaína atendidos
pelo programa, de 14 a 24 anos, mostra que 30%, ao fim do
acompanhamento, afirmavam ter deixado a droga.
Para fazer o trabalho, metade dos usuários recebeu aconselhamento comum e
outra parte foi atendida com entrevista motivacional. Dos integrantes
desse último grupo, 40% disseram ter deixado a droga. As informações são
obtidas por meio de relatos dos próprios pacientes.
"Temos de nos fiar na veracidade das informações prestadas. Mas estudos
internacionais mostram que nesse tipo de entrevista a confiabilidade é
de aproximadamente 85%", conta Helena.
Entre maiores de 24 anos, os resultados foram menos expressivos.
Daqueles que receberam atendimento convencional, 15% relataram
abstinência. "Quanto menos tempo de uso, mais vínculos o usuário tem,
menores são os estragos e, portanto, mais fácil é a recuperação."
O serviço começou a ser feito em 2005. No ano passado, o programa foi
integrado ao Crack, É Possível Vencer e o atendimento foi ampliado. O
número de consultores deverá passar dos atuais 20 para 30 até o fim do
ano. Ao longo desse período, 2,5 milhões de chamadas foram feitas.
"Atendimentos propriamente ditos foram 400 mil", diz a professora.
Perfil
A maior parte das pessoas que procura o VivaVoz é das classes C e D. São
homens solteiros, com mais de 35 anos e ensino fundamental incompleto,
diz Helena. "Acreditamos que o serviço pode ser um instrumento valioso
de acesso ao tratamento."
O psiquiatra do Programa de Orientação e Atendimento a Dependentes da
Universidade Federal de São Paulo (Proad-Unifesp), Tiago Fidalgo,
considera a entrevista motivacional uma estratégia importante. "Ela
estimula o paciente a passar de um estágio de contemplação, aquele em
que está começando a pensar em interromper um vício ou hábito, para um
planejamento mais efetivo e, numa outra etapa, para a ação", afirma.
A estratégia completa também pode ser eficaz em momentos de recaída.
"Com a entrevista, a pessoa é estimulada a não desistir e retomar a
ação." Já o psiquiatra Mauro Aranha não exibe o mesmo entusiasmo. "É um
recurso interessante, mas muito limitado", afirma. Para ele, esse tipo
de atendimento serve apenas para uma primeira orientação.
Telefonemas
A professora Helena Barros afirma não haver informações se as pessoas
atendidas pelo serviço procuram, simultaneamente, um tratamento
presencial. O VivaVoz cabe a estudantes de cursos na área de saúde e
assistência social. "A ideia é ajudar a pessoa que está do outro lado da
linha a escolher uma data para parar ou reduzir o uso da droga", conta
Helena.
O ritmo de ligações no serviço de viva-voz aumenta quando a noite
avança. Nesse horário, a maior parte dos telefonemas é de dependentes
pedindo ajuda para encontrar o tratamento. Muitos deles sob efeito de
drogas, conta a consultora Cláudia Flores Abrahan.
Nos dois anos de trabalho no VivaVoz, Cláudia, que é também estudante do
7.º semestre de Psicologia, já atendeu incontável número de
telefonemas: além de dependentes, estudantes em busca de informações
para trabalhos escolares, familiares querendo orientações sobre como
lidar com o parente usuário de drogas.
Não é raro também receber ligações de crianças interessadas em ajudar os
pais a abandonar o vício. "Para cada público, temos de ter a linguagem
apropriada, uma abordagem diferente. Mas sempre procurando transmitir
motivação para enfrentar o problema", conta.
O telefonema mais crítico, recorda, ocorreu há alguns meses. Do outro
lado da linha, um dependente dizia que ia se matar. "As conversas vêm
carregadas de emoção. Muitas vezes sugerimos que a pessoa vá buscar um
copo d’água para se acalmar, esperamos o tempo que for necessário",
relata.
Quando um tratamento consegue sucesso e a pessoa resolve parar de se
drogar, é recomendado ao usuário fazer um acompanhamento até seis meses
depois da interrupção da droga. Nesse período, sete ligações são feitas e
compromissos são retomados. "Muitos conseguem completar o ciclo",
destaca a professora Helena Barros.
Mas, como o atendimento do serviço também é aleatório, Cláudia afirma
que nunca sabe qual será o próximo caso. "Temos de estar sempre bem
preparados. Telefonemas duram o quanto for necessário." A experiência
que adquiriu até agora trouxe uma certeza. "Assim que me formar, vou
continuar trabalhando na área."
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.
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