quinta-feira, 10 de maio de 2012

Pode ser mais eficiente

#EntrevistaSUS | Fazer muito com pouco

Diálogos Capitais: Saúde sanitária | Foto: Erasmo Salomão

Ministro da Saúde, Alexandre Padilha, em entrevista concedida à revista CartaCapital, afirma que o sistema público é subfinanciado, mas pode ser mais eficiente.
Os recursos do Ministério da Saúde têm crescido, mas o titular da pasta, o médico Alexandre Padilha, acredita que ainda há muito que fazer. O desafio começa por definir como a área será financiada, e passa por mudanças na forma de gastar. “No Brasil, a sociedade precisa continuar debatendo duas questões: como investir melhor os recursos que temos para a saúde e como ter um financiamento cada vez maior para a saúde do País”, disse o ministro a CartaCapital.
De acordo com Padilha, é importante que o Brasil garanta a transferência de tecnologia quando adquire equipamentos sem similar nacional, como tem feito o Ministério da Saúde na área de radioterapia. Leia, a seguir, os principais trechos da entrevista:
CartaCapital: Como tem se comportado o orçamento da Saúde?
Alexandre Padilha: Desde o período do presidente Lula, o governo federal aplica aquilo que está na Emenda Constitucional 29, que faz com que o orçamento da saúde seja o mesmo do ano anterior, acrescido da variação do PIB e da inflação. Isso fez com que, desde o começo do governo do presidente Lula, tenhamos um orçamento crescente para a saúde.
Comparando 2011 com 2010, tivemos aumento de 13 bilhões de reais em valores absolutos, e de 17% no orçamento, vamos chegar a um pouco mais de 80 bilhões de reais, superando inclusive o está estabelecido na Emenda 29.
CC: Ainda faltam recursos para financiar a saúde?
AP: Isso não resolveu o debate de como financiar a saúde no País. Ainda temos uma defasagem no financiamento da saúde pública, comparado ao setor privado. O setor suplementar cuida de 45 milhões de pessoas e investe três vezes mais per capita do que a saúde pública. Sabemos que mesmo as pessoas que têm plano de saúde, nos procedimentos da mais alta complexidade, tratamento de câncer, tratamento de doenças crônicas ou serviços de urgência e emergência, acabam procurando o sistema de saúde pública, o SUS. Então a sociedade precisa continuar debatendo duas questões: em primeiro lugar, como investirmos melhor os recursos que temos para a saúde, como melhorar a gestão da saúde, como ganhar eficiência e como combater fortemente qualquer desvio de recursos para a saúde. A outra questão é como ter um financiamento cada vez maior para a saúde do País.
CC: Que opções teríamos para ampliar os recursos da área?
AP: Esse é um debate que o Congresso tem de fazer. Eu, como ministro, a alternativa que tenho é fazer mais com o que temos. Primeiro precisamos combater qualquer tipo de desperdício de recursos. Em 2011, mudamos a forma como o Ministério da Saúde comprava medicamentos. Uma parte dos medicamentos distribuídos no SUS tem compra centralizada no ministério. E mudamos a forma de compra dos medicamentos de hemoderivados e insumos.
CC: A compra é feita por leilão?
AP: Centralizamos a compra no pregão eletrônico. Em relação aos hemoderivados, produtos relacionados a fatores do sangue, conseguimos mais eficiência e uma economia de 1,7 bilhão de reais na aquisição dos medicamentos. Em um ano, aumentamos em quatro vezes o número de pessoas com acesso aos remédios para hipertensão e diabetes de graça na farmácia popular. Ou seja, economizamos de um lado e combatemos qualquer tipo de desperdício.
CC: Qual o investimento anual no programa de distribuição de medicamentos?
AP: No programa para hipertensos e diabéticos são cerca de 800 milhões de reais. No conjunto de compras de medicamentos e vacinas, investimos quase 10 bilhões de reais. O Ministério da Saúde tem um poder de compra que temos utilizado para reduzir o preço dos medicamentos, facilitar o acesso da população e cobrar transferência de tecnologia de medicamentos e produtos para o Brasil. Só podemos ter o programa de vacinação que temos hoje porque 96% das doses de vacinas são produzidas no Brasil. Ou seja, transferimos tecnologia.
“Nosso poder de compra tende a reduzir preços e garantir transferência de tecnologia” – afirma Padilha.
CC: Há um programa no ministério para trazer fornecedores de equipamentos para radioterapia. Não há fabricantes locais?
AP: Não temos nenhuma empresa que produza o acelerador linear para radioterapia no Brasil. A balança comercial de equipamentos na saúde é de quase 4 bilhões de dólares negativos. O único setor de equipamentos em que a gente mais vende do que importa é o odontológico. A cadeia de equipamentos é muito deficitária. Nesse plano de radioterapia, que é a maior aquisição internacional que o setor público está fazendo, a empresa tem como obrigação passar a produzir no Brasil num curto período de três anos. São 80 equipamentos que ela pode até importar, mas no final terá de ter a fábrica instalada no Brasil, senão vai ter de devolver o dinheiro. Esse é um investimento de 500 milhões de reais.
CC: O ministério tem contratado novos servidores? Existe a necessidade de mais pessoal?
AP: Temos essa necessidade, mas quem contrata são os estados e municípios. O ministério coordena as políticas. Não temos gestão direta, são poucos os serviços em que temos gestão direta, apenas seis hospitais federais no Rio de Janeiro. A maior parte dos serviços é de responsabilidade dos estados e municípios. Porém, uma pesquisa revelou que o Brasil abre 19 mil novos postos de trabalho para médicos por ano, isso em dados do ano passado. Precisamos distribuir melhor os médicos. Temos estados onde há 4 médicos por mil habitantes e estados, como o Maranhão, onde temos 0,6 médico por mil habitantes. Precisamos nos aproximar das médias de outros países, que têm sistemas nacionais públicos. Por exemplo, a Inglaterra tem 2,7 médicos por mil habitantes. A Espanha, 3. Portugal tem 3,2. O Brasil todo tem 1,9 médico por mil habitantes.
CC: Vemos cenas caóticas em hospitais, pessoas esperando dias para serem atendidas. Será que não está faltando um choque de gestão?
AP: Isso passa, sobretudo, por uma organização da rede de serviços. O Ministério da Saúde tem um programa chamado SOS Emergências, no qual pegamos as maiores urgência e emergências do País, as áreas mais críticas da baixa qualidade de atendimento, em hospitais de estados e municípios, e estamos juntamente com eles reorganizando os serviços e a relação desses hospitais com o conjunto da rede. Toda vez que abrimos uma Unidade de Pronto Atendimento (UPA) 24 horas, a cada cem pessoas que procuram direto um pronto-socorro, 97 têm seu problema resolvido em 24 horas.
CC: Quantas UPAs estão em operação?
AP: Hoje temos 150 funcionando, e ao todo são quase 600 em construção.
CC: Foi aprovada pelo Senado a venda pelos supermercados de medicamentos não controlados. Qual a posição do ministério sobre o assunto?
AP: Vai para um debate interno no governo. Precisamos ver o texto final, que foi aprovado detalhadamente. A presidenta tem o tempo dela para decidir isso.
CC: A Anvisa tem duas vagas para diretores em aberto. Por que não foram feitas as nomeações?
AP: Priorizamos o plano de reestruturação da Anvisa, inclusive para se definirem a competência e o papel de cada diretoria. Com esse novo plano de reestruturação, temos papéis definidos para cada uma das diretorias. A partir daí, a gente pode definir qual é o critério técnico mais apropriado para ocupar essa diretoria, qual é o perfil técnico mais apropriado, e aí o governo encaminhará para o Senado os nomes.
Fonte: Revista CartaCapital – Edição 696 / 4 de maio de 2012

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