quarta-feira, 26 de junho de 2013

Pode ter êxito


Juíza diz que justiça terapêutica pode ter êxito no Brasil

Deborah White-Labora, magistrada em Miami, abriu ciclo de debates sobre dependência química nesta segunda (24), na ALMG.

O ciclo de debates continua nesta terça-feira (25), a partir das 9 horas, com o painel "Justiça Terapêutica – perspectivas e desafios"
O ciclo de debates continua nesta terça-feira (25), a partir das 9 horas, com o painel "Justiça Terapêutica – perspectivas e desafios" - Foto: Willian Dias

“Definitivamente a cadeia não recupera o dependente químico. A implantação da justiça terapêutica é, de fato, onerosa, mas o modelo já alcança resultados concretos. Acredito que a criação do sistema no Brasil seja viável”.

 O apontamento foi feito pela juíza da Corte de Drogas do Condado de Miami, Deborah White-Labora, em palestra que abriu o Ciclo de Debates Um Novo Olhar sobre a Dependência Química, realizada na noite desta segunda-feira (24/6/13), no Plenário da Assembleia Legislativa de Minas Gerais.

A juíza, ao resgatar sua experiência, ressaltou que as prerrogativas da justiça terapêutica começaram a se delinear há 25 anos, quando Miami vivia certo colapso social em função do aumento da criminalidade e do consumo de drogas, sobretudo da cocaína, e, logo em seguida, do seu subproduto, o crack. “Ficamos conhecidos como a capital da cocaína, do assassinato. As prisões estavam lotadas. Descobrimos que os procedimentos que tínhamos em mãos não dariam conta de mudar essa realidade”.

Segundo a magistrada, para cada dólar gasto pela Corte de Drogas na reabilitação do dependente, economizam-se três dólares
Segundo a magistrada, para cada dólar gasto pela Corte de Drogas na reabilitação do dependente, economizam-se três dólares - Foto: Willian Dias

Para a magistrada, a justiça terapêutica, dentre outros princípios, deve se pautar pelo beneficio legal e pela reabilitação. Ela explicou que a reabilitação consiste em oferecer tratamentos para interromper o processo de dependência e, que, para tanto, a corte conta com equipes de trabalho, incluindo defensores públicos e promotores de justiça. O “cliente”, nome que ela dá ao detento que se integra ao processo de recuperação, deve ser atendido por uma abordagem global. Segundo a juíza, enquanto uma corte convencional aplica apenas a punição, “nós oferecemos assistência também em relação à moradia, até um tratamento odontológico se for preciso”.

O acompanhamento do dependente químico é rigoroso, e ele só obtém “alta” e tem sua ficha “limpa” quando preenche certas condições, como estar empregado por pelo menos seis meses. Além de apresentar resultados positivos, a abordagem também gera economia. De acordo com a magistrada, para cada dólar gasto pela Corte de Drogas na reabilitação do dependente, economizam-se três dólares com outras despesas como a manutenção de cadeias.

Labora encerrou sua palestra dizendo que “Minas é o coração do Brasil”, onde, segundo ela, foi recebida com muita hospitalidade. A juíza diz ainda acreditar no potencial do Estado para criar seu próprio modelo de justiça terapêutica. Ela conta que já recebeu representantes de diversos países, inclusive parlamentares mineiros, para conhecer o funcionamento da corte. Nesta terça-feria (25), será a vez dela conhecer o trabalho feito pelas comunidades terapêuticas mineiras.


O deputado Vanderlei Miranda relembrou as ações do Parlamento mineiro ligadas ao tema
O deputado Vanderlei Miranda relembrou as ações do Parlamento mineiro ligadas ao tema - Foto: Willian Dias
Em seu pronunciamento, o deputado Vanderlei Miranda (PMDB), representando o presidente da ALMG, deputado Dinis Pinheiro (PSDB), relembrou as ações do Legislativo de Minas que buscaram fomentar políticas públicas capazes de enfrentar o problema. Ele deu destaque à criação, em 2013, da Comissão de Prevenção e Combate ao Uso de Crack e Outras Drogas, que pretende dar continuidade aos trabalhos da comissão especial anteriormente criada com o mesmo objetivo.

Outro evento que mereceu a atenção de Vanderlei Miranda foi a realização da Marcha contra o Crack, em 23 de junho de 2012, que reuniu 15 mil pessoas entre deputados estaduais e federais, estudantes, prefeitos da Região Metropolitana, vereadores de Belo Horizonte, líderes religiosos católicos e evangélicos e entidades da sociedade civil. “Temos certeza, há muito tempo, de que o Parlamento, isolado, não é capaz de alcançar soluções para problemas sociais complexos como este. Sabemos que o fim desta cruel epidemia só será possível com o envolvimento de todos”, ressaltou o deputado.

Também o subsecretário de Estado de Políticas sobre Drogas, Cloves Benevides, enfatizou a criação de uma comissão permanente cuja prioridade é somar esforços para combater o tráfico e o uso de drogas. “Considero a Assembleia um exemplo para todo o País. Este evento é mais uma contribuição do Legislativo à consolidação das políticas públicas do Estado. Ter a ALMG como parceira é um privilégio, pois as discussões promovidas aqui realmente se transformam em resultados concretos”, afirmou.

Juíza responde questões sobre práticas e limitações da justiça terapêutica

Formulário disponível no Portal da Assembleia possibilita a participação do público nos debates
Formulário disponível no Portal da Assembleia possibilita a participação do público nos debates - Foto: Willian Dias
Ao avisar sobre seu interesse de interagir com o público presente, a juíza Deborah White-Labora abriu caminho para questionamentos de agentes públicos e demais cidadãos. A magistrada respondeu perguntas sobre a abordagem do processo de recuperação; a diferenciação do tratamento dispensado a crianças e adolescentes; os casos que são encaminhados às cortes tradicionais; as sanções impostas aos dependentes; dentre outras.

A deputada Liza Prado (PSB) quis saber o que a Corte de Drogas de Miami considera como “tratamento mínimo” aos dependentes químicos. A juíza explicou que as exigências mínimas para quem aceitou participar do processo de recuperação são: comparecer duas vezes por semana a sessões com terapeuta; a realização de exames, três vezes a cada semana, para checar se houve consumo de drogas; ir à corte sempre que for requisitado; e participar, semanalmente, de uma reunião de grupos como os narcóticos anônimos. “O percurso não é fácil, eles têm que trabalhar duro, mas os resultados são positivos e, ao final, nos agradecem por não termos desistido deles”, salientou.

Já a magistrada da Vara Infracional da Infância e Juventude do Tribunal de Justiça de Minas Gerais, Valéria da Silva Rodrigues, teceu considerações a respeito das leis brasileiras que exigem cumprimento regular da pena pelo dependente químico, sendo permitido o tratamento apenas em concomitância com a sanção. Deborah White-Labora ressaltou que a Corte de Drogas aplica sanções, às vezes, intercalando um período de reclusão com etapas do processo de tratamento, mas que autores de crimes violentos não são beneficiados pela justiça terapêutica.

Como abordar e julgar os casos em que o usuário de drogas acaba se transformando em um pequeno traficante para sustentar o seu consumo? A preocupação do deputado Paulo Lamac (PT) mereceu atenção da juíza, que afirmou ser uma questão também complexa para o sistema judicial norte-americano. Labora explicou que existem limitações legislativas que impõem um julgamento convencional àqueles que são acusados de tráfico. Mas ela ressalva que, quando a promotoria entende que se trata de um caso de dependência, há a possibilidade de dar ao indivíduo “uma segunda chance”.

Painéis - Nesta terça-feira (25), as atividades do ciclo de debates se iniciam às 9 horas, com o painel "Justiça Terapêutica – perspectivas e desafios". O painel "Ações para o tratamento de dependente – o que está sendo feito?" compõe a programação da tarde, com início previsto para as 14 horas. Após cada painel, serão realizados debates, com a palavra aberta a todos os participantes inscritos.

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