quinta-feira, 14 de junho de 2012

Opção

Pesquisadora comenta opção pela cesárea no país

Publicada em
A pesquisadora Maria do Carmo Leal (Demqs/ENSP) concedeu entrevista ao jornal O Globo, publicada no domingo (10/6), na qual comentou a alta prevalência da cesariana no país. A coordenadora do projeto Nascer no Brasil: Inquérito Nacional sobre Parto e Nascimento – pesquisa realizada com 24 mil mulheres do país que optaram pela cesárea – falou sobre um estudo feito no Rio e na Baixada Fluminense, cujos resultados mostraram que, no início da gravidez, 70% das mulheres queriam parto vaginal, mas apenas 30% confirmavam seu desejo ao fim dos nove meses.
 
 “A maioria dos bebês nascia mesmo por cesárea. Por que elas mudavam de opinião? Algumas queriam ligar as trompas, outras eram influenciadas por seus médicos, mas a maioria tinha medo da dor”, admitiu a pesquisadora. A reportagem destaca a cultura da cesárea no país e a necessidade de uma boa assistência pré-natal.
 
Nesta mesma edição, Maria do Carmo Leal é autora do artigo "Estar grávida no Brasil" (em anexo), no qual aborda como são conduzidos os partos hoje no país.
 
O Globo
A questão do parto
10 de junho de 2012
 
 
Número de cesáreas confirma cirurgia como primeira opção das mulheres
 
Viviane Nogueira - viviane.nogueira@oglobo.com.br
 
Se você perguntar à grávida mais próxima como ela quer que seu bebê chegue ao mundo, ela provavelmente responderá que por parto normal. Ainda assim, dados sobre nascidos vivos do Ministério da Saúde mostram que, em 2010 (ano mais recente desse levantamento), nas redes pública e privada, 52,2% dos partos realizados foram cesarianas e 47,8% foram normais. O motivo pode estar entre os instintos mais básicos: o medo. Um estudo feito em 2008 no Rio e na Baixada Fluminense pela epidemiologista Maria do Carmo Leal, da Escola Nacional de Saúde Pública da Fiocruz, mostrou que no início da gravidez 70% das mulheres queriam parto vaginal, mas ao fim dos nove meses apenas 30% confirmavam seu desejo. A maioria dos bebês nascia mesmo por cesárea. Por que elas mudavam de opinião? Algumas queriam ligar as trompas, outras eram influenciadas por seus médicos, mas a maioria tinha medo da dor.
 
- A cesárea já está no inconsciente coletivo, é a experiência da maioria. Os médicos aqui não sabem fazer parto, já aprendem a cirurgia na universidade.
 
Nos outros países não há essa cultura intervencionista, mas as mulheres são mais bem assistidas no pré parto, ficam em banheiras de água quente, recebem massagem para relaxar e aprendem a respirar para conduzir o parto, isso diminui o medo - acredita a pesquisadora, que prepara para agosto uma pesquisa com 24 mil mulheres do país sem problema algum de saúde que optaram pela cesárea.
 
Pela Organização Mundial de Saúde, o recomendado é que apenas 15% das mulheres deem à luz por cesárea, uma cirurgia ótima para quando há algum problema. Quando não há, o ideal é o parto vaginal para evitar o estresse orgânico do corte de tecido, infecções, cicatrizes uterinas e a alienação da mãe na hora do nascimento do bebê por causa da anestesia. Para tentar atender a esta demanda, o Ministério da Saúde criou em 2011 o Rede Cegonha, que prevê consultas de pré-natal, a presença do acompanhante durante o parto, e centros de parto normal com leitos adaptados para num só lugar acolher a mulher antes, durante e depois do parto. Hoje, o valor repassado ao médico do Sistema Único de Saúde (SUS) no parto normal já é maior que nas cesáreas e, segundo o ministro da Saúde, Alexandre Padilha, já se pensa em remunerar as horas que o médico acompanha a mulher no parto normal.
 
- É preciso mudar a cultura dos médicos que hoje se aprimoram na cirurgia e deixam de lado o parto vaginal.
 
O que vai reduzir o número de cesáreas é a gestante chegar segura à maternidade. Até 2014 queremos 80% das grávidas com no mínimo seis consultas de pré-natal e exames de sífilis, HIV e ultrassonografia feitos - anuncia Padilha.
 
Na experiência da professora da Faculdade de Ciências da Saúde da Universidade de Brasília (UnB) Daphne Rattner, presidente da Rede pela Humanização do Parto e Nascimento (ReHuNa), as mulheres cada vez mais reivindicam seus corpos e o direito de parir. E para isso a melhor opção seria o parto domiciliar. De acordo com a "The Cochrane Collaboration", pesquisa da fundação sem fins lucrativos feita com 8.677 mulheres, quando comparados com os hospitais, os partos em casa apresentaram menos intervenções médicas e mais satisfação materna, com a ressalva de que cuidadores e pacientes devem estar atentos para sinais de complicações.
 
- Gravidez não é doença e parto não é cirurgia, mas a cultura influencia muito.
 
Em 1997, participei de um encontro internacional e a representante do Nepal disse que lá o médico aprende que a dor é sinal de que algo está errado e é preciso intervir. Já a parteira diz 'oba, as dores começaram, vamos ver o que há para fazer' - conta Daphne.
 
Por aqui a Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia (Febrasgo) é terminantemente contra partos domiciliares porque considera que um parto só é sem riscos depois de 24 horas que aconteceu.
 
- Muitas interferências podem acontecer mesmo num parto normal, como uma hemorragia e a consequente retirada do útero. E às vezes, na transferência de casa para o hospital, a morte da mãe pode acontecer - explica a diretora administrativa da Febrasgo, Vera Lúcia Mota da Fonseca, que defende a cesárea em indicações precisas e acredita que a gravidez acompanhada por uma equipe múltipla pode servir para aumentar o número de partos normais. - Dessa forma o médico não precisa largar o consultório e correr para a maternidade: a mulher entra em trabalho de parto, vai para a maternidade em que fez o pré-natal e lá o médico disponível faz o parto.
 
A ginecologista e obstetra Cláudia Araújo Bottino credita à vida moderna a opção das mulheres "ocupadas e estressadas" pela cesárea: - A carga da mulher hoje não é só ser mãe. Ela é profissional, esposa, dona de casa e mãe. E por isso não quer sentir dor - diz.
 
A dor não desanimou a publicitária Simone Pinto, que queria que seu filho João, hoje com sete meses e meio, nascesse quando estivesse pronto. As contrações começaram às 3h, ela monitorou tranquilamente, chegou ao hospital às 8h30 e às 15h recebeu o bebê.
 
- Eu senti dor mas curti, foi um momento intenso de dor e prazer.
 
Mas a todo momento eu sabia que se algo desse errado eu poderia contar que minha médica faria a cesárea - conta.
 
Opção polêmica
 
Dados: O número de cesáreas na rede pública vem aumentando na medida em que diminuem os partos normais. No SUS, os percentuais de cesáreas em 2009, 2010 e 2011 foram 34,6%, 36,7% e 38,3 enquanto o de partos normais, 65,3%, 63,2% e 61,6%. Nas redes pública e privada (os dados dos nascidos vivos) o percentual de cesáreas aumentou de 50% para 52,2% entre 2009 e 2010 e o de partos normais caiu de 50% para 47,8% no mesmo período.
 
Mãe: Como toda cirurgia, a cesárea pode ter como desdobramentos, além da cicatriz aparente, uma fibrose uterina, o que pode dificultar a implantação do embrião em uma próxima gestação. Por isso muitos médicos indicam que o no segundo parto de uma mulher que já tenha feito uma cesárea se repita a cirurgia.
 
Bebê: A idade gestacional do feto é determinada por ultrassonografia ou pela data da última menstruação da mãe, mas esses métodos não podem precisar a data exata do nascimento.
 
Natural ou normal: A nomenclatura natural é usada quando todos os processos biológicos do nascimento do bebê são respeitados.
 
Ou seja: não há anestesia, não há corte para ajudar a passagem da cabeça. Já o parto normal é o vaginal, no qual o bebê sai pela vagina e a mãe pode contar com a interferência médica.
 
SUS: No primeiro ano do programa Rede Cegonha, houve queda de 21% na mortalidade decorrente de complicações na gravidez e no parto. No Estado do Rio, já há uma unidade em funcionamento no Hospital da Mulher, em São João de Meriti e a próxima será inaugurada em Mesquita. Em 2011, mais de 1,7 milhão de mulheres fizeram no mínimo sete consultas pré-natais pelo programa.
 
Dor: Segundo Daphne Rattner, a dor faz parte do processo de parto e, "quando a mulher se mexe por causa da dor, a cabeça do bebê se encaixa". Mais importante que qualquer estratégia ou planejamento já traçado é que o parto seja bom para a mãe e para o bebê.
 
Fonte(s): O Globo

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