quinta-feira, 14 de junho de 2012

Avanço

12/06/2012 16h48 - Atualizado em 13/06/2012 08h59

Vacina contra esquistossomose pode sair em 4 anos, diz médica brasileira

Dose inédita passou por primeiros testes em humanos e se mostrou segura.
Doença parasitária atinge 200 milhões de pessoas na África e no Brasil.

Luna D'Alama Do G1, em São Paulo

A vacina contra esquistossomose ou barriga d'água desenvolvida e patenteada pelo Instituto Oswaldo Cruz (IOC), que pertence à Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), no Rio de Janeiro, pode chegar ao mercado em três ou quatro anos, segundo a diretora do IOC, a médica infectologista Tania Araújo Jorge.
"É a primeira vacina no mundo contra parasitas. Até hoje, só existem doses contra vírus e bactérias. Ainda precisamos passar por mais três fases de testes clínicos em humanos. Completamos apenas a primeira", diz.
A esquistossomose é causada por um esquistossomo, animal invertebrado do filo dos platelmintos, e atinge 198 milhões de pessoas na África e 2 milhões no Brasil, além de ameaçar outros 800 milhões em 70 países. Sintomas como anemia, febre e diarreia são os mais comuns.
Os testes iniciais contra a doença foram feitos desde maio do ano passado com 20 adultos voluntários que vivem no Rio, área considerada não endêmica, ou seja, onde não há transmissão ativa do parasita. Cada indivíduo recebeu três doses.
Esquistossomose (Foto: Gutemberg Brito/IOC)Instituto Oswaldo Cruz é pioneiro em criação de vacina contra esquistossomose (Foto: Gutemberg Brito/IOC)
 
"Essa é uma doença que não interessa a indústria farmacêutica, pois está concentrada em países pobres, com higiene e saneamento básico precários. Queremos que a vacina tenha validade de pelo menos dez anos e seja barata ou de graça, pelo Sistema Único de Saúde", afirma a diretora.
É a primeira vacina no mundo contra parasitas. Até hoje, só existem doses contra vírus e bactérias"
Tania Araújo Jorge,
diretora do Instituto Oswaldo Cruz
O objetivo dos testes preliminares foi analisar a segurança desse tipo de imunização e verificar a presença de efeitos colaterais como náusea, febre e dor de cabeça. Foi constatada apenas dor local após a aplicação, já que a injeção é intramuscular.
A segunda fase de testes deve começar entre o fim deste ano e o início de 2013, com 200 crianças em idade pré-escolar (até 6 anos), destacou Tânia. Será feita em uma área endêmica, no Brasil e nos países da África, durante cerca de seis meses. A intenção é testar novamente a segurança da vacina.
"Passada essa etapa, será avaliada a eficácia da dose e ampliada a aplicação para milhares de pessoas. Na fase quatro, a escala será de milhões de voluntários", destaca a médica.
Esquistossomose 2 (Foto: Gutemberg Brito/IOC)Caramujo da espécie Biomphalaria glabrata albina é um hospedeiro do parasita (Foto: Gutemberg Brito/IOC)
 
A imunização contra a esquistossomose deve ser destinada a crianças de até 6 anos de idade e incluída, no futuro, no Calendário Nacional de Vacinação do Ministério da Saúde, de acordo com Tânia.
A diretora do IOC revela que a vacina é produzida com tecnologia brasileira de última geração, a partir de uma proteína de parasitas do gênero e espécie Schistosoma mansoni. Essa proteína é transferida para leveduras chamadas Pichia pastoris ou para bactérias.
"Assim, a proteína fica mais pura e bem caracterizada, com um melhor padrão de qualidade. É um processo parecido com o da vacina contra a hepatite B", ressalta a infectologista.
Essa é uma doença com transmissão ativa no mundo, mas não interessa a indústria farmacêutica, pois está concentrada em países pobres"
Tania Araújo Jorge,
diretora do Instituto Oswaldo Cruz
Assim como em outras vacinas, a dose nacional foi produzida a partir de um antígeno – substância que estimula a produção de anticorpos – para preparar o sistema imunológico humano à infecção. Com isso, evita-se que o parasita se instale no organismo ou lhe cause danos.
Cerca de 30 especialistas do IOC estão envolvidos nesse projeto, que ainda conta com a parceria de três consultores externos.
Até hoje, o tratamento da esquistossomose – que é transmitido aos humanos por água contaminada com esse parasita multicelular, que antes do homem habita caramujos de água doce, do gênero Biomphalaria – é feito com o uso de medicamentos. Mas, como a pessoa não fica imune, precisa tomar novamente o remédio a cada reinfecção.

Como foi feita a vacina
Os pesquisadores usaram a proteína Sm14, obtida do Schistosoma mansoni. Essa proteína-base, isolada no IOC ainda na década de 1990, foi escolhida pela Organização Mundial da Saúde (OMS) como um dos seis antígenos mais promissores no combate à esquistossomose.
O teste em voluntários teve início logo após a aprovação do protocolo clínico de pesquisa pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e foi conduzido pela equipe do Instituto de Pesquisa Evandro Chagas (Ipec/Fiocruz).
Além dessa vacina, a Fiocruz pesquisa antígenos contra os quatro vírus da dengue e contra os parasitas da leishmaniose e da malária.
"Essa vacina pode abrir caminho para as outras. O Brasil ser autossuficiente nesse conhecimento não tem preço", enfatiza a diretora do IOC.

Nenhum comentário:

Postar um comentário